O triunfalismo da igreja imperial
A partir do imperador Constantino (313), o cristianismo começou a influenciar diretamente a arte ocidental, em todas as suas expressões. O crescente poderio da igreja passou a ser traduzido em manifestações artísticas cada vez mais ricas e sofisticadas. Se nos primeiros séculos predominaram os temas da filantropia e da amizade com Cristo representados pela figura do Bom Pastor, a partir da união da igreja com o estado romano entrou em cena uma temática que pode ser designada como triunfal e gloriosa. Cristo passou a ser representado como o Senhor glorioso e o Juiz eterno que reina supremo à destra de Deus. Um exemplo sugestivo é uma pintura da catacumba de Comodila, ao sul de Roma, datada do quarto século, em que Cristo, tendo a cabeça circundada por um halo, está ladeado pelo alfa e o ômega, o princípio e o fim, simbolizando o seu poder eterno.
As controvérsias trinitárias e cristológicas do quarto e do quinto séculos, nas quais Jesus Cristo foi formalmente definido pelos primeiros concílios ecumênicos como consubstancial com o Pai, bem como plenamente divino e humano, fizeram com que, durante toda a Idade Média, essa ênfase triunfal se acentuasse nas diferentes manifestações da arte sacra. Obviamente, nesse aspecto um dos temas prediletos dos artistas foi a cena da ressurreição, da qual existem exemplos magníficos em muitas partes da Europa e do Oriente Médio. Um deles se encontra na igreja de Cora (hoje uma mesquita), em Constantinopla ou Istambul, em que um mural datado de mais ou menos 1320 mostra o Salvador ressurreto e vitorioso sobre a morte pisoteando os portões despedaçados do hades e ressuscitando Adão e Eva. A Catedral de Monreale, na Sicília, possui na abóbada acima do altar um estupendo mosaico bizantino de Cristo Pantokrátor (“governante de tudo”). Curiosamente, até mesmo algumas representações da crucificação podem ter esse tom triunfal, visto simbolizarem a vitória de Cristo sobre Satanás e o pecado.
Mesmo depois que as representações materiais de Cristo já estavam bem estabelecidas na arte sacra cristã, persistiram dúvidas na mente de muitas pessoas quando à propriedade das imagens do mesmo. Entre o final do século sétimo e meados do século nono, ocorreu no Império Bizantino (o império romano oriental ou grego) o célebre “movimento iconoclasta”, em que vários imperadores se opuseram tenazmente à veneração dessas imagens, considerando-a uma forma de idolatria. Isso resultou em grande parte de pressões externas: as imagens eram obstáculos na controvérsia com os monofisitas (que se concentravam na natureza divina de Cristo), com os maniqueístas (que consideravam má toda a matéria) e com os muçulmanos (que rejeitavam representações da forma humana). Depois de um conflito longo e por vezes violento, chegou-se a uma solução intermediária: seriam admissíveis somente quadros ou pinturas de Cristo, de Maria e dos santos (ícones), e não estátuas dos mesmos. A justificativa para tanto foi a encarnação – visto que Deus se tornou humano em Jesus Cristo, ele assumiu todas as características humanas, inclusive a visibilidade. Os ícones da igreja ortodoxa estão entre as mais belas manifestações da arte religiosa cristã.
Fonte:Alderi Souza MatosInstituto Presbiteriano Mackenzie
Postado por Helio Rubiales
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